Naufrágio do Dona Lourdes II: 'Nós perdemos as pessoas mais importantes das nossas vidas. Mas o responsável está vivo e livre'
09/09/2024
Tragédia que resultou na morte de 24 pessoas expõe questões sobre o transporte fluvial para o Marajó Brenda e a filha de 2 anos morreram no naufrágio no Pará
Lucas Trevisan/TV Liberal
Há dois anos, a vida de Diva Oliveira mudou para sempre. Ela e a família estavam na lancha dona Lourdes II, que transportava cerca de 80 passageiros do arquipélago do Marajó para Belém, e naufragou próximo à ilha de Cotijuba, resultando na morte de 24 pessoas. A lancha fazia a viagem sem autorização dos órgãos competentes. Na tragédia, Diva perdeu a filha, Brenda Naiara Seabra Oliveira , e a neta, Lívia Vitória Seabra, de apenas 2 anos.
Diva relata os momentos de angústia enquanto lutava pela própria vida e pela vida da pequena Lívia. Elas ficaram à deriva dentro da água por 2h30, quando um pescador as encontrou e fez o resgate. Mas infelizmente, a saúde de Lívia já estava muito afetada.
“O pescador já tinha resgatado cinco pessoas quando me encontrou. Ele resgatou a minha neta e depois conseguiram me colocar pra dentro da rabeta também. Minha neta chegou a ir pra UPA. A médica disse que devido ela ter engolido muita água, sendo tão pequena, ela veio a óbito”.
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Diva e familiares de vítimas se reuniram neste domingo (8) na Praça da República, em Belém, para exigir justiça. Dois anos após o naufrágio, ninguém foi responsabilizado. A tragédia expôs a precariedade do transporte fluvial na região, que, segundo a população marajoara, permanece crítica e sem perspectiva de melhorias desde aquele 8 de setembro de 2022.
Diva Oliveira (de óculos) perdeu a filha e a neta no naufrágio
Lucas Trevisan/TV Liberal
A data de dois anos do naufrágio também marca o anseio dos familiares das vítimas que aguardam pelo julgamento do piloto da embarcação, Marcos de Souza Oliveira, acusado pelo Ministério Público do Estado por crimes de homicídio e tentativa de homicídio.
A audiência de instrução e julgamento de Marcos está marcada para o próximo dia 1 de outubro, no Fórum Criminal de Belém. Até agora ninguém sabe onde está a lancha, que foi retirada do fundo do rio e levada para lugar incerto.
Familiares de vítimas de naufrágio da lancha Dona Lourdes II farão novo protesto por Jutiça
Lucas Trevisan/TV Liberal
“O dia de hoje é um sentimento de tristeza, de angústia, de revolta. Até agora ainda não temos resposta nenhuma. No dia 1º de outubro, está prevista a primeira audiência e nós esperamos que realmente tenhamos uma resposta. Hoje estamos aqui, infelizmente nem todas as famílias puderam vir pela dificuldade de sair da sua cidade”, diz Diva.
“Acreditamos em Deus, e aguardamos a justiça da terra pra aliviar um pouco o nosso sofrimento. Enquanto nós perdemos as pessoas mais importantes das nossas vidas, Marcos está vivo e ao lado da família dele”, lamenta.
Sem transporte seguro
Ao mesmo tempo em que a população de Cachoeira do Arari, Salvaterra e Soure espera por justiça, luta para conseguir que embarcações seguras façam a viagem entre a capital e a foz do Rio Camará, onde fica o principal porto da região.
“Nós continuamos numa situação ainda pior do que antes, porque o governo do Estado até hoje não autorizou a única empresa que entrou na rota para a foz do Rio Camará opere de maneira legal”, definiu Dário Pedrosa.
Ele é um dos coordenadores do movimento "Vidas marajoaras importam’", que luta, desde a tragédia com a Dona Lourdes II por transporte fluvial seguro.
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O g1 solicitou um posicionamento sobre a Agência de Regulação e Controle dos Serviços Públicos de Transporte (Artran), Agência de Regulação e Controle de Serviços Públicos do Estado do Pará (Arcon) e para a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (antiga Secretaria de Estado de Transportes), mas nenhum deste órgãos respondeu ao questionamento sobre a situação do transporte fluvial para o Marajó.
Atualmente, as linhas fluviais entre Belém e Camará são feitas por lanchas que cobram de R$ 45 a R$ 65 a passagem.
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Uma lancha faz a linha Cachoeira do Arari / Belém, mas o trajeto dela não alcança as comunidades rurais e ribeirinhas, cuja população precisa se deslocar até a porto de Camará. A Dona Lourdes II fazia a viagem sem autorização dos órgãos competentes.
Considerando que o acesso do centro da cidade de Salvaterra e de Cachoeira do Arari para o porto na foz do Rio Camará é feito pelo transporte complementar de vans, que cobram até R$ 15 por pessoa, a viagem ‘ida e volta’ entre Belém e esta parte do Marajó custa pelo menos R$ 120, valor este que não está dentro da renda de muitas famílias marajoaras.
A única alternativa para pagar mais barato é fazer a travessia de balsa, mas o tempo de viagem é maior e linha é até o distrito de Icoaraci.
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